Sarajevo, ponto de encontro de culturas

Fundada pelo Império Otomano no século XV, a vibrante capital da Bósnia e Herzegovina esteve no centro do mais longo cerco da história moderna da Europa. Hoje, através de um grande esforço de reconstrução a cidade procura retornar à sua antiga glória, sendo reconhecida pela sua hospitalidade, comida, natureza e atrações multiculturais, resultado de séculos de ocupação de diferentes civilizações ao longo dos séculos: romanos, Otomanos e Austro-húngaros. Sarajevo é definitivamente um ponto de encontro de culturas.

Sarajevo ponto de encontro de culturas

Sarajevo é, por isso, uma cidade com uma história atribulada. Ao longo dos últimos 150 anos, fez parte de oito Estados diferentes: o Império Otomano, o Império Austro-Húngaro; o Estado dos Eslovenos, Croatas e Sérvios; o Reino dos Eslovenos, Croatas e Sérvios; o Estado Independente da Croácia, a República Socialista Federativa da Jugoslávia e finalmente a Bósnia e Herzegovina independente. A cidade evoluiu até hoje, absorvendo as influências das diferentes civilizações que por ali passaram ao longo dos séculos.

A vibrante capital da Bósnia é, por tudo isto, uma mistura de culturas, a começar pelo seu centro histórico, conhecido como a “Cidade Velha”. Coração da cidade, é uma viagem no tempo, albergando uma das maiores misturas culturais da Europa. Pelo centro estão espalhadas mesquitas, sinagogas e igrejas católicas e ortodoxas, um reflexo da complexa história de Sarajevo e da sua rica diversidade cultural.

Parti à descoberta desta Sarajevo conhecida como ponto de encontro de culturas.começando pela Baščaršija, o seu centro histórico. É a parte mais antiga da cidade e, durante o período otomano, a sua principal artéria e área de comércio. Durante os séculos XVI e XVII, Baščaršija foi um dos maiores centros comerciais dos Balcãs. No final do século XVI, tinha 40 bazares, com as mais diversas atividades artesanais, desde os têxteis, ao metal, ouro e joias. Algumas ruas mantiveram até hoje os nomes destas “lojas” e os produtos continuam a ser produzidos da mesma formal artesanal por artesãos locais. Baščaršija mantém-se hoje, como nos últimos séculos, o epicentro do comércio artesanal e o centro gastronómico da cidade. Aqui podem-se encontrar as mais populares aščinicas (restaurantes especializados nos famosos estufados Bósnios), buregdžinicas (restaurantes especialistas na confeção do Burek) e as ćevabdžinicas (especialistas na confeção de Ćevapi e Pljeskavice).

Sarajevo ponto de encontro de culturas
Sarajevo ponto de encontro de culturas

As suas labirínticas ruas de paralelepípedos, transportaram-me numa viagem ao passado. A famosa Praça Baščaršija parece parada no tempo. Ponto de encontro e o coração fervilhante do centro histórico, aqui pode-se apreciar as idas e vindas dos comerciantes, os cheiros dos mais deliciosos pratos locais, doces e salgados, o cheiro do café tradicional Bósnio e a lufa-lufa dos turistas que se juntam na famosa fonte Sebilj. Todos querem beber um trago da sua água que, segundo dizem, é “mágica”. A encantadora fonte árabe é um dos símbolos mais conhecidos de Sarajevo. De acordo com a lenda, todos aqueles que bebem água de Baščaršija retornarão a Sarajevo.

Sarajevo ponto de encontro de culturas

Da movimentada Praça Baščaršija, trilhei caminho em direção ao emblemático edifício da Câmara Municipal, Vijećnica.  Considerado um dos mais belos edifícios da cidade, foi construído durante o período Austro-Húngaro e é símbolo duma Sarajevo que foi um ponto de encontro de culturas durante séculos. O seu estilo arquitetónico pseudomourisco representa uma mistura perfeita entre o Oriente e o Ocidente. Localizada na margem do rio Miljacka, tem uma vista privilegiada para as Montanhas circundantes.

Sarajevo ponto de encontro de culturas

E da Vijećnica, segui ao longo das margens do Miljacka aproveitando para explorar algumas das mais icónicas pontes de Sarajevo. O rio flui através da cidade, dividindo-a em dois lados – o lado de Bistrik (conhecido como o lado húmido) e o lado Vratnik (o ensolarado). Cada uma das pontes que unem as duas margens tem a sua particularidade ou história única. A começar na Ponte Kozija, a única que ainda data do período otomano, sobrevivendo totalmente intacta. Foi construída no século XVI na Estrada do Imperador, uma estrada que ligava a cidade à sede do Império Otomano em Istambul.

Já a ponte Latina é das mais famosas pelo importante momento histórico que lhe está associada. Localizada na parte antiga da cidade foi testemunha do assassinato do príncipe Austro-Húngaro, Franz Ferdinand e da sua esposa, Sophie, a 28 de junho de 1914, que despoletou a I Guerra Mundial e o fim do Império Austro-Húngaro.

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Mas a ponte que guarda as memórias mais dramáticas e tristes da história de Sarajevo é a Ponte Suada e Olga, assim chamada, pois foi neste local que Suada Dilberović e Olga Sučić foram mortas a 5 de abril de 1992 enquanto participavam nos protestos contra a guerra. Foram consideradas as primeiras de muitas vítimas inocentes mortas no cerco à cidade.

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De volta ao centro, a primeira imagem que observa lá no alto é o emblemático Relógio Sahat Kula, o único no mundo que utiliza o horário lunar, sistema utilizado para ajudar os muçulmanos a saberem o horário das suas orações. De acordo com este sistema, cada novo dia começa ao pôr do sol. Para manter este sistema é necessário calibrar o relógio a cada três dias, dever a cargo do muvekit. Duas vezes por semana, este responsável por manter o relógio preciso sobe os 76 degraus de Sahat Kula para acertar a hora. Sem este ajuste manual o relógio deixaria de funcionar no espaço de uma semana. A torre do relógio tem 30 metros de altura e foi construída no século XVI. O mecanismo atual foi trazido de Londres em 1875.

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Junto à Torre encontra-se o bazar coberto ou Bezistan de Gazi Husrev Bey. É o maior mercado coberto de Sarajevo e foi construído em 1542 por ordem do governador Gazi Husrev Bey. A enorme estrutura de pedra já abrigou 52 lojas que vendiam mercadorias importadas de toda a Europa e do Império Otomano. É um excelente local para trazer lembranças e prendas para a família e amigos.

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Ainda no centro segui para a Tašlihan, uma antiga Estalagem de pedra, construída ao longo da Muralha Ocidental, próxima do centro comercial da cidade durante o período otomano.  Mais uma vez Sarajevo Mostra-se como ponto de encontro de culturas. Foi duramente danificada por um incêndio em 1879 e não voltou a ser reconstruída. Outra pousada famosa, esta ainda em pé, é a Morića Han, o único Caravanserai remanescente na cidade. Antigo local onde as caravanas dos mercadores se alojavam durante o período otomano. É um espaço que exala uma atmosfera especial que nos transporta no tempo, para uma época em que os viajantes e comerciantes de todo o mundo aqui ficavam. Atualmente, Morića Han alberga alguns cafés, restaurantes e lojas de têxteis locais.

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Volto ao tema da fusão cultural entre o Oriente e o Ocidente. Sarajevo é verdadeiramente uma cidade única na convivência de diferentes culturas. Motivo que deu origem ao local “Sarajevo, Ponto de encontro de culturas”. Este ponto marca o cruzamento de várias ruas onde é visível a dicotomia entre ocidente e oriente. Ali encontrei o encanto oriental da Rua Sarači que se cruza com a rua Ferhadija, de estilo mais ocidental. Para oeste encontram-se assim a zona de influência Otomana, com a mesquita Bezistan Gazi Husrev Bey em destaque. Na direção oposta, do lado ocidental encontrei edifícios do período Austro-húngaro, onde se destaca a imponente Catedral católica do Sagrado coração de Jesus. A meio caminho entre oriente e ocidente está localizada a Velha Sinagoga, exemplo da importante presença judaica na cidade, e a Igreja Ortodoxa, uma das mais antigas casas de culto de Sarajevo.

Sarajevo ponto de encontro de culturas

A Mesquita de Gazi Husrev Bey foi construída no centro de Baščaršija em 1530. Foi projetada pelo arquiteto principal no Império do Otomano e construída pelo governador otomano Gazi Husrev Bey, responsável por algumas das mais importantes e imponentes construções na cidade. Gazi Husrev governou a Bósnia, durante 20 anos. Atualmente, é o monumento arquitetónico mais importante do período otomano na Bósnia e Herzegovina. Um espaço imponente, mas, ao mesmo tempo, um espaço de paz e tranquilidade, onde fiquei apenas observar os rituais diários da religião muçulmana e a forma como o espaço faz parte da sua vida diária de uma forma natural, quase orgânica.

Sarajevo ponto de encontro de culturas

A Catedral do Sagrado Coração de Jesus, por seu lado, é a sede da Religião Católica na cidade. A sua construção foi inspirada no design da Catedral de Notre Dame, em Dijon e na Catedral de St. Teyn, em Praga. A Catedral tem, no seu exterior, uma estátua de homenagem ao Papa João Paulo II, que visitou Sarajevo em 1997, para enviar uma mensagem de paz e tolerância à Bósnia. O Papa fez ainda questão de contribui ainda para a sua reconstrução, solicitando apenas que se mantivesse, para memória futura, um dos seus recantos exteriores onde são visíveis sinais de bombardeamentos.

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A Igreja Ortodoxa dos Arcanjos Gabriel e Miguel é uma das mais antigas casas de culto de Sarajevo, tendo sido construída em meados do século XVI, abaixo do nível do solo e escondida atrás de muros de pedra, construída nas fundações de uma igreja do século V. O interior apertado é suportado por colunas de madeira e dominado por um maravilhoso iconóstase dourado. O museu vizinho, inaugurado em 1890, é um dos mais antigos da Bósnia e exibe alguns tesouros da igreja.

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Por fim, a Velha Sinagoga construída em 1850 para a vibrante e numerosa comunidade judaica de Sarajevo. A maioria dos judeus destes judeus eram descendentes de Espanha e Portugal, expulsos da Península Ibérica na década de 1490. Os governantes otomanos da Bósnia deram-lhes refúgio, valorizando a sua experiência bancária e comercial. O edifício foi saqueado durante a II Guerra Mundial e usado como prisão judaica durante o Holocausto, quando a população judaica da cidade, de 12 000 habitantes, foi reduzida em cerca de 85%. No pós-guerra a sinagoga foi restaurada apenas para ser novamente danificada pelos bombardeamentos durante a Guerra da Bósnia. Voltou a ser renovada em 2003, altura em que passou a museu, documentando a próspera cultura judaica na região até o Holocausto.

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A outra margem

Se ainda tiver tempo, depois de absorver estas experiências, locais, cores, cheiros e sabores da zona velha, não deixe de atravessar uma das inúmeras pontes de Sarajevo e visitar a “outra margem”. Ali pode-se visitar a Mesquita do Imperador, a Igreja de Santo António de Pádua, as estreitas e íngremes ruas deste peculiar bairro construído na encosta das montanhas que rodeiam a cidade.

A Mesquita do Imperador é a mais antiga de Sarajevo e uma das mais antigas na Bósnia. Presume-se que Isa Bey Ishaković, o fundador de Sarajevo, a tenha mandado construir logo após a fundação da cidade em 1462. A Igreja de Santo António de Pádua, mesmo ao lado, foi construída em 1882 e era o único local de culto para os católicos até à conclusão da Catedral do Sagrado Coração de Jesus em 1889.

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Um pouco mais longe da cidade, vale ainda a pena visitar a Fortaleza Amarela, uma das fortificações que compõem a muralha defensiva da cidade velha. Posicionada no penhasco de Jekovac, tem uma das mais fantásticas vistas de Sarajevo. Este é também o local onde é disparado o canhão que ao pôr do sol, durante o mês Islâmico do Ramadão, assinala o culminar do jejum.

Sarajevo Yellow Fort.

Guia de Viagem:

Como chegar: pode chegar à Bósnia de avião, através do Aeroporto Internacional de Sarajevo, de Comboio, de autocarro e de carro. Qualquer que seja o destino.

Como se deslocar: o centro da cidade é compacto e com acesso restrito a automóveis, pelo que é facilmente visitado a pé. Para zonas um pouco mais longe pode apanhar o elétrico ou autocarro.

Moeda: A moeda servia é o KM e pode ser trocado no aeroporto ou casas de cambio local, ou mais fácil ainda, levantado em qualquer ATM na cidade.

Língua: O Bósnio é uma língua eslava, muito próxima do Sérvio e do Croata.

Onde comer: no centro histórico existem inúmeras buregdžinicas (restaurantes especialistas em Burek) e ćevabdžinicas (especialista na confeção de Ćevapi), que são os restaurantes de fast food locais. Para uma refeição mais completa e variada as buregdžinicas são a melhor opção, uma vez que servem pratos mais complexos como os tradicionais ensopados e estufados. Para uma experiência local completa experimentar o restaurante localizado no interior da Morića Han alberga que serve comida tradicional bósnia de grande qualidade, num ambiente animado e intemporal.

O que comer: além dos famosos estufados Bósnios com legumes e carne, as melhores iguarias são os Burek, espécie de empada gigante recheada de carne, os Ćevapi, rolos de carne com pão pita fino, cebola e iogurte e os Pljeskavice, uma espécie de hambúrguer espalmado servido da mesma forma.

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Os doces são também uma perdição, desde a famosa Baklava ao Kunefe, especialmente quando acompanhados pelo delicioso café Bósnio. Recomendo uma visita ao Demleme Turk Çayi, um café na praça central, onde estas iguarias são uma verdadeira especialidade.

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Como dizia, Sarajevo é definitivamente um ponto de encontro culturas. Não concordam?

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