Uma das mais entusiasmantes viagens que já fiz foi uma viagem pelo deserto da Tunísia, um percurso ao seu interior árido. Assim, partimos de Hammamet até Douz, cidade que assinala a entrada no Deserto do Saara.
Sabia que a viagem ia ser longa, mas ao entrar no autocarro que nos levaria nesta viagem, fiquei também a saber que seria desconfortável. O Ar Condicionado era bem velho, assim como o próprio autocarro. No entanto, rapidamente esqueci aonde ia para me concentrar na paisagem que via a passar pela janela. Conforme o autocarro percorria km atrás de km fui-me apercebendo da mudança gradual. A terra passou a ser cada vez mais árida, mais silenciosa. Notei também diferença no rosto e comportamento das pessoas com quem nos cruzamos, mais calorosas, mais verdadeiras.

El Jem
A primeira paragem foi em El Jem, uma pequena aldeia que guarda um dos maiores tesouros da antiguidade, o Coliseu de Thysdrus. Este coliseu é o segundo maior construído pelos romanos (a seguir ao de Roma) e um dos mais bem preservados do mundo. Tem um comprimento de 148 m por 122 m de largura, uma altura de cerca de 35 m e podia acomodar 35 mil espetadores. Por isso, foi inscrito pela UNESCO, em 1979, na lista dos locais ou monumentos, Património da Humanidade. Ao contrário do Coliseu de Roma, aqui consegui visitar os subterrâneos onde anteriormente animais e homens aguardavam para entrar na arena. Estes túneis, além de serem impressionantes pelo drama e sofrimento que testemunharam, são também um excelente local, leia-se fresco, de abrigo para descansar do abrasador calor tunisino (dava certamente para fazer um ovo mexido numa pedra).


Matmata
De El Jem prosseguimos até mesmo à entrada do deserto, até Matmata e a paisagem que aqui nos recebeu era tão árida, tão selvagem que parecia que estava noutro planeta. Almoçamos no restaurante local comida tradicional. De seguida fomos visitar as tradicionais casas trogloditas escavadas na rocha. São verdadeiras obras de engenharia pela forma como são “construídas”. Estas são escavadas nas encostas da montanha, em redor de um vasto poço, que constitui o pátio da casa. Esta construção permite manter, mesmo no pico das mais altas temperaturas, o interior das casas ameno. Fomos recebidos de forma calorosa pela família troglodita. Mostraram a casa, os animais, as suas tradições e deram-nos a provar o seu chá e pão.


Quase me deixei ficar por aqui.

Douz, a porta de entrada no deserto
Prosseguimos viagem, chegando finalmente ao oásis de Douz, mesmo na porta do Saara. Em Douz foi apresentada à última aventura do dia, andar de camelo, em pleno deserto ao por do Sol. Além dos nossos adoráveis amigos que, amorosamente, nos transportaram às costas, a experiência de sentir o deserto a palpitar, ver as dunas a dançar com o vento e assistir ao por do sol, com as suas cores, foi única. Poesia à parte, a aventura de camelo foi indescritível! Primeiro pelo cómico da situação (porque tive que me vestir como uma verdadeira beduína) e depois porque subir para um camelo é das coisas mais cómicas que já fiz na vida. Verdade!! O bicho tem uma paciência para os turistas como nunca vi. O truque é fincar as pernas e agarrarmo-nos como se a nossa vida depende-se disso e arrancar em direção ao por do sol.


No dia seguinte o despertar foi bem cedo, pelas 4h da manhã. Hora ideal para quem seguia viagem em direção aos lagos de sal do Saara para assistir ao nascer do sol. E a experiência vale muito a pena…não só pelo fenómeno dos lagos secos completamente a transbordar de sal, como, mais uma vez, pelo espetáculo das cores.


Tamerza, um oásis no meio do deserto
Daqui seguimos caminho num Jeep do inferno. Os bancos não tinham molas e o estofo estafa tão gasto que cada solavancos da estrada era como descer escadas de rabo. Foi assim que chegámos ao Oásis de montanha de Tamerza, o maior da Tunísia. Ali aguardava-me uma grande surpresa (vá média, mas na altura pareceu um pote de ouro). Um rústico café, num oásis no meio do nada tinha maquina de café expresso! Há quantos dias não bebia um café expresso? Como verdadeira portuguesa delirei, esqueci que estava integrada num grupo e seguida lançada para o café. Claro que provoquei o caos. Todo o grupo teve que parar para que eu, e mais 2 ou 3 portugueses que seguiam no grupo matássemos o vício. Mas valeu a pena…
Voltando a Tamerza, a primeira imagem que guardo é a mancha de palmeiras e as suas copas verdes que se destacam no meio de uma imensidão de deserto. E também a pequena nascente de água que alimentava todo aquele pedaço luxuriante de terra. É uma paisagem que marca, pelo impacto de saber que nada ali sobrevive por muito tempo e que aqueles homens e mulheres ali vivem (ou sobrevivem) há centenas de anos.
Chebika
Nas imediações do oásis visitamos Chebika, uma antiga aldeia abandonada após as inundações que causaram mais de 400 mortos em toda a Tunísia. A aldeia foi reconstruída um pouco mais acima e ali se tem mantido, como que parada no tempo.

Outra memória que trago de Chebika é que este oásis já esteve debaixo do mar (parece impossível certo?). As provas são inegáveis, rochas com fosseis só possíveis de encontrar no mar. Como é que noutros tempos o mar cobriu esta zona inóspita do mundo é a pergunta que nos fica na cabeça. Na verdade, esta é apenas uma das muitas questões que nos surgem quando percorremos este oásis cuja vida, cultura, gentes e tradições se mantém intocáveis.

A viagem prosseguiu de regresso ao destino final, vagarosa e sonolenta, ao som do ar condicionado do autocarro e com todas as imagens dos dois dias onde entramos num universo cheio de contrastes: desertos e montanhas rochosas, a cor da areia (a perder de vista) e as roupas coloridas dos povos do deserto, paisagens selvagens com pequenos oásis de calma e cheios de vida.
Susse
Chegámos finalmente à última paragem, Susse, a terceira maior cidade da Tunísia. Tivemos apenas tempo para uma volta pela cidade onde o objetivo era visitar a mesquita, mas infelizmente não foi possível, chegamos mesmo na era hora da oração e a hora da oração é sagrada. A Medina está rodeada de grandes muros que fortificam esta parte da cidade. Deambulei por aqui e por ali, explorando as cores, sons e alguns produtos locais. Foi um final de viagem mais calmo e introspectivo.


A Tunísia é conhecida pelas suas paisagens únicas, as águas e límpidas, as praias de areias finas, as mesquitas e as medinas, onde rapidamente aprendemos a regatear até aquilo que não nos interessa. A Tunísia é uma mistura de muitas experiências, todas diferentes, que nos conquistam e nos envolvem para sempre.
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